segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Elegia

Eu lembro da primeira vez que te segurei com minhas mãos saudáveis. Dentes pequenos, garras afiadas. Eu lembro da ultima vez que te segurei com minhas mãos quebradas. Um corpo esquálido e o mesmo espírito indomável.
Eu lembro do animais mortos que você me ofereceu, da gentileza e da selvageria que existia atrás dos seus olhos. 

Eu lembro de momentos em que você parecia me entender.
Tudo isso se dissolve e converge em um ponto, uma memória ruindo sobre o seu próprio peso.

Você se foi muitas vezes e sempre voltou quando queria. Se recusou a ser doméstica e mostrava uma resistência feroz  a qualquer regra sobre ti.

Você se foi pela ultima vez, me enganando e passando por mim. Encontrou o emplastro para todos os males sob a guarda de sua verdadeira dona. Sob os seus próprios termos.

Eu te amei muito.

Eu sei que nunca mais vou te encontrar. No dia quando eu for abraçado por um Deus misericordioso e tragado pelo abismo, você ainda estará correndo pelo campo das coisas selvagens.

Nenhum comentário:

Postar um comentário